Tributação Sobre Cigarros Pode Reduzir Mortalidade Infantil E Desigualdade, Aponta Estudo

Aumentar os impostos sobre cigarros pode salvar vidas de crianças e ajudar a reduzir desigualdades sociais em países de baixa e média renda, incluindo o Brasil. É o que revela um estudo publicado na revista científica The Lancet, que analisou dados de 94 países responsáveis por 90% das mortes de crianças menores de 5 anos em todo o mundo.

Segundo os pesquisadores, a exposição ao tabaco — durante a gestação ou na infância, por meio da fumaça passiva — causa cerca de 200 mil mortes infantis evitáveis a cada ano. A maioria dessas mortes ocorre em populações pobres, onde a exposição ao cigarro e suas consequências é mais intensa.

“Medidas de controle do tabaco, especialmente tributárias, têm potencial para proteger as crianças e reduzir disparidades em saúde”, destaca o estudo.

Desigualdade e impacto da tributação

A pesquisa evidencia que o consumo de tabaco e a exposição infantil à fumaça são significativamente mais altos entre as populações de menor nível socioeconômico. Apesar disso, até 2020, apenas 10 dos países analisados adotavam uma carga tributária sobre cigarros igual ou superior a 75% do valor de varejo — percentual mínimo recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Se todos os 94 países tivessem atingido esse patamar de tributação em 2021, o estudo estima que cerca de 281 mil mortes infantis poderiam ter sido evitadas, incluindo quase 70 mil entre as famílias mais pobres.

Ainda assim, entre 2008 e 2020, as taxas de mortalidade infantil caíram em todas as faixas de renda. Contudo, a queda foi mais expressiva entre os mais ricos (34,9%) do que entre os mais pobres (33,4%). Em 2020, a taxa média de mortalidade entre os mais pobres ainda era quase o dobro da registrada entre os mais ricos: 47,6 contra 24 óbitos a cada mil nascidos vivos.

Brasil: tributo alto, preço baixo

O Brasil já pratica uma alíquota média de 83% sobre o cigarro, acima da meta da OMS. No entanto, o preço mínimo da cartela, mesmo após ser reajustado em 2024 de R$ 5,00 para R$ 6,50, está aquém do necessário. Segundo a Receita Federal, o valor atualizado pela inflação desde o último reajuste (2016) deveria ser de R$ 11,88.

“O aumento da alíquota não é suficiente se o preço mínimo continuar defasado. O cigarro ficou mais barato ao longo dos últimos oito anos, em termos reais”, alerta André Szklo, pesquisador do Instituto Nacional do Câncer (Inca). “Isso estagnou a queda no número de fumantes e até impulsionou o consumo entre adolescentes.”

O Brasil também discute a implementação de um novo imposto seletivo, previsto na reforma tributária, que incidirá sobre produtos nocivos à saúde, como o tabaco. Para surtir efeito, especialistas defendem que a nova tributação seja acima da inflação e do crescimento da renda média da população, além de prever reajustes anuais automáticos.

“É preciso garantir que a política de preços funcione como instrumento de saúde pública. Isso significa manter o cigarro inacessível, principalmente para os jovens e os mais vulneráveis”, reforça Szklo.